12 de abril de 2014

Verde (Cor de) Rótulo

Verde (Cor de) Rótulo


O que é o rótulo ecológico?

A ideia de rotulagem ecológica surge no âmbito da União Europeia, por proposta da Comissão e tendo em conta parecer do Comité Económico e Social em 1992, e ganha acentuada forma jurídica pelo Regulamento (CE) nº 1980/2000, do Parlamento Europeu e do Conselho, a 17 de Julho de 2000.
O objectivo central era a criação de um sistema de rotulagem de produtos que apresentassem um reduzido impacto ambiental ao longo do seu ciclo de vida – desde o cultivo das matérias-primas que o compõe até à sua fabricação, transporte, comercialização e a sua eliminação ou reciclagem – e que permitisse prestar informações precisas, exactas e cientificamente comprovadas aos consumidores sobre o impacte ambiental que determinado produto produzia.

Uma década de experiência passada neste domínio, razões de eficácia e de racionalização de funcionamento levam a que se altere o sistema instituído e, deste modo, que se proceda a uma alteração de regime, introduzida efectivamente pelo Regulamento (CE) nº 66/2010, e que deve ser aplicada no respeito e prossecução das disposições dos Tratados constitutivos da Comunidade Europeia, que desde logo revelam preocupações ambientais – veja-se o Título XIX do Tratado que constitui a Comunidade Europeia – neste moldes prosseguindo uma actuação baseada no princípio da precaução (art. 174º/2 TCE).

A introdução deste regime de rótulo ecológico visa, em termos de política ambiental prosseguida pela União Europeia, promover os produtos com um nível elevado de desempenho ambiental a fim de reduzir o impacte negativo da produção e do consumo no ambiente, saúde, clima e recursos naturais.

Neste sentido, e com preocupações a nível das repercussões que esta realidade traz ao mercado, tem-se debruçado o Comité do Comércio e do Ambiente da Organização Mundial do Comércio que introduziu a questão da eco rotulagem na sua lista de estudos.

O Ambiente, como bem público e colectivo, exige que a sua preservação seja preocupação de todos os agentes do mercado – consumidores, produtores e comercializadores – para além da necessária preocupação estatal, como entidade idónea a fazer cumprir normas de gestão verde dos recursos naturais.

É possível envolver também aqui, em torno desta realidade, as ONG ambientais e as organizações de consumidores, como entidades mais próximas dos consumidores que podem desempenhar um papel central na sua sensibilização para estas preocupações ambientais. E podem também, como interessados, dar início e conduzir o processo de elaboração ou de revisão dos critérios de atribuição do rótulo ecológico da UE, nos termos do nº 1 do art. 7º do Regulamento.

A existência de instrumentos de mercado, como realidades integrantes de protecção e conservação ambientais, permite aproximar consumidores e mercadores em torno de uma realidade que não é mais indiferente.

E, nestes termos, o cidadão passa a tomar parte da decisão, abandonando-se a ideia de que o Direito Administrativo apresenta uma posição estritamente defensiva do cidadão perante as actuações de autoridade da Administração. Estamos aqui, nas palavras do Professor Vasco Pereira da Silva, no âmbito de uma administração infra-estadual, característica de um denominado Estado Pós-Social.

Na verdade, quando falamos em atribuição de um rótulo ecológico comunitário por uma entidade competente a um agente económico estamos na presença de um verdadeiro acto administrativo. Neste sentido, veja-se a posição de Mário Tavares da Silva, na sua tese de mestrado que, seguindo o pensamento e citando, uma vez mais, do Professor Vasco Pereira da Silva, e partindo de uma ideia ampla de acto administrativo, defende que “… tanto as decisões de carácter regulador como as actuações de conteúdo mais marcadamente material, os actos de procedimento como as decisões finais, as actuações internas, bem como as actuações externas, são consideradas pela lei actos administrativos”, e determina a qualificação das actuações administrativas tomadas no âmbito do rótulo ecológico como “actos administrativos não reguladores, porquanto destituídos de capacidade de produção efectiva e imediata de efeitos jurídicos numa situação individual e concreta”.

Admissibilidade de produtos que podem apresentar este rótulo

Podem apresentar rótulo ecológico todos os bens e serviços distribuídos, consumidos ou utilizados no espaço económico europeu, salvo os medicamentos para uso humano (estipulados pela Directiva 2001/83/CE) e para uso veterinário (definidos pela Directiva 2001/82/CE), ou quaisquer outros instrumentos médicos, conforme estipulado no artigo 2º do Regulamento.

Os critérios específicos de atribuição do rótulo ecológico a um produto não estão plasmados no Regulamento (CE) nº 66/2010, mas ali estão determinadas as regras que devem ser atendidas na fixação “a posteriori” desses critérios, genericamente enunciadas no art. 6º do Regulamento, como sejam, por exemplo, considerações quanto aos impactes ambientais, a redução do número de ensaios em animais ou a durabilidade média de vida do produto.

A determinação de critérios específicos, da competência da Comissão com contribuição do Comité do Rótulo Ecológico da União Europeia, nos termos do art. 5º do Regulamento, é variável e adequa-se às diferentes gamas de produtos que podem apresentar o rótulo, tendo em conta, para cada caso, estudos científicos e consultas alargadas no âmbito desse mesmo Comité.

Neste momento estão definidos pela União Europeia 31 grupos de produtos que podem apresentar o rótulo ecológico. Assim, por exemplo, os critérios estabelecidos para a utilização do “ecolabel” em tintas e vernizes para interiores encontram-se predefinidos na Decisão da Comissão de 13 de Agosto de 2008, ao passo que os critérios relevantes para a utilização do rótulo em produtos de papel de jornal já se encontram estabelecidos pela Decisão da Comissão de 12 de Julho de 2012.

O regime (voluntário) do rótulo ecológico

A utilização da rotulagem verde está dependente, primeiro que tudo, da vontade do produtor ou do retalhista, uma vez que estamos no âmbito de um instrumento de mercado voluntário, o que nos é esclarecido desde logo pelo disposto no art. 1º do Regulamento (CE) nº 66/2010.

Assim sendo, o operador que pretenda utilizar o rótulo ecológico, depois de confirmar que o seu produto é um dos elegíveis para a sua utilização, deve apresentar o pedido ao organismo competente do Estado-membro, conforme estipulado nos termos do art. 4º do Regulamento, e de acordo com as regras estabelecidas pelo art. 9º do mesmo diploma. Este organismo competente tem como principal função estabelecer a ligação entre proponente e a União Europeia e, como tal, deve fornecer toda a assistência necessária ao proponente durante a fase de candidatura.

Para tal o interessado deve preencher um formulário de candidatura e pagar uma taxa, exigida nos termos do art. 9º, nº 4 do Regulamento, e que tem como função assegurar as despesas de funcionamento do sistema de atribuição do rótulo ecológico. Esta taxa será variável conforme se trate de PME (pequenas e médias empresas), de micro-empresas, de proponente inserido num país em desenvolvimento ou de proponente registado no EMAS (sistema comunitário de ecogestão e auditoria), e é determinada casuisticamente de acordo com o disposto no Anexo III do Regulamento.

Os pedidos dirigidos pelos proponentes às entidades competentes devem especificar todos os elementos de contacto do operador, o grupo em que se insere o produto em questão e uma descrição completa desse produto, para além de todas as outras informações que possam ser pedidas por essas entidades, de acordo com o estipulado pelo nº 3 do art. 9º do Regulamento.

Pode ser necessária também a apresentação de testes laboratoriais a fim de se comprovar que o produto candidato a apresentar o rótulo ecológico está conforme os critérios estabelecidos para a sua atribuição. Os custos inerentes a este procedimento estão a cabo do proponente, nos termos do 3º parágrafo, nº 5, do art. 9º do Regulamento, não se encontrando por isso incluídos nas despesas de funcionamento do sistema que são asseguradas pelo pagamento das taxas acima descritas.

Toda a informação relativa a um produto candidato a ostentar o rótulo ecológico deve ser devidamente organizada num dossiê que permita a troca de informações entre o organismo competente para atribuir o rótulo num determinado caso, a Comissão Europeia e todos os demais organismos competentes a nível europeu, por exemplo nos casos determinados pelo art. 9º, nº 10 e art. 10º, nº 5, e nos termos gerais do art. 13º do Regulamento.

O organismo competente nacional, depois de avaliar a candidatura e verificar que se encontram verificados os critérios ecológicos de desempenho exigidos para o produto no caso concreto, atribui um número de registo ao produto, de acordo com o estatuído pelo parágrafo 2º, nº 5, do art. 9º do Regulamento, permitindo assim que este utilize o rótulo ecológico da EU, caracterizado por uma flor, cujas pétalas são 15 estrelas, relativas a cada um dos Estados-membro da União Europeia, em 1992, e que respeita o modelo indicado pelo Anexo II do Regulamento.

Esta utilização está sujeita também à condição de se encontrar estipulada em termos contratuais, e concertada entre o organismo competente e o operador económico, utilizando-se para tal o modelo definido pelo Anexo IV do Regulamento (CE) nº 66/2010, “ex vi” art. 9º, nº 8 e 9 do mesmo Regulamento, sendo com base nela que eventualmente se podem determinar sanções ao seu não regular cumprimento, nos termos do art. 17º do Regulamento.

O organismo competente em cada Estado-membro tem então os poderes e atribuições que lhes são conferidos pelos nºs 4 a 8 e pelo nº 10 do art. 9º do Regulamento, no que respeita a atribuição do rótulo ecológico da UE, e aqueles que lhes são atribuídos pelos nºs 2, 5 e 6 do art. 10º do mesmo Regulamento, no que se refere a fiscalização do mercado e controlo da utilização.

O proponente autorizado para empregar o rótulo ecológico num seu produto, para além da taxa inicialmente paga, tem ainda de assegurar o pagamento de uma taxa anual pela utilização dessa rotulagem, também determinada pelo Anexo III do Regulamento (CE) nº 66/2010. E aqui se pode avaliar, posteriormente, a real utilidade e sucesso da adopção deste regime de rotulagem verde, uma vez que o valor da taxa será determinado em 0,15% do volume anual de vendas do produto em questão.

Assim, quanto maior for o sucesso do agente do mercado que directa e presumivelmente beneficia com a ostentação do rótulo ecológico, maior a contribuição recebida pela UE como contrapartida ganha pelo benefício atribuído ao agente pelo sistema de rotulagem verde, e maior então a capacidade económica para, eventualmente, se desenvolver este sistema ou dar lugar a outros processos que promovam a protecção ambiental.

Também a promoção deste sistema de rotulagem ecológica por parte dos Estados-membros, da Comissão e dos membros do Comité do Rótulo Ecológico da União Europeia, nos termos do art. 12º do Regulamento, se obriga, assim, a fazer cumprir.

A atribuição do rótulo ecológico é publicada, pela Comissão Europeia, no sítio web do eco-label.

Procedimentos (em específico) em Portugal

No caso português, o Sistema Comunitário Revisto de Atribuição do Rótulo Ecológico foi implementado pelo Despacho nº 15511/2006, de 28 de Junho, do Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional e da Economia e da Inovação.

O requerente, em Portugal, que pretenda ostentar o rótulo ecológico no seu produto deve emitir o seu pedido à DGAE (Direcção-Geral das Actividades Económicas) que, depois de uma proposta devidamente fundamentada, envia-o para a APA (Agência Portuguesa do Ambiente), a fim de ser avaliado por uma Comissão de Selecção à qual presidem a APA, a DGAE e outros organismos especializados.

Vantagens da utilização do rótulo

Apresentando carácter facultativo, o regime de eco rotulagem tem de se revelar atractivo para os operadores do mercado e como tal, devem-se apresentar vantagens para a sujeição a esse mesmo regime.

Não se pode rejeitar a ideia de que são os consumidores que, em última análise, exercem ou exigem que se exerça um grande impacte ambiental no planeta, a fim de se lhes conseguir proporcionar todos os bens e serviços fundamentais para a satisfação de necessidades diárias. Assim sendo, as opções desses agentes económicos influenciam em grande escala o sucesso ou ausência dele dos demais agentes que se movem no mercado, e podem as suas escolhas determinar alterações comportamentais no processo de extracção, industrialização, distribuição, venda e eliminação dos produtos existentes nesse mesmo mercado.

Nestes termos pode-se afirmar que quem ostentar este rótulo nos seus produtos tem, desde logo, uma vantagem determinante a apresentar nos nichos de mercado ecologicamente orientados e que, assim, dão preferência aos “produtos verdes” e que impõe como condição para a escolha a sua verificação.

Da análise do regime de atribuição do rótulo ecológico é perceptível o grau de exigência e os critérios rigorosos que se impõe para que seja possível apresentar este rótulo num produto que circule no mercado europeu. E esta exigência permite ao consumidor fazer uma escolha informada, sabendo e confiando que aquele produto, apresentando rotulagem verde, é seguramente “environmentally friendly”.

Sendo uma rotulagem reconhecida em todos os países do mercado Europeu – incluindo a Noruega, o Liechtenstein e a Islândia – o agente económico que apresentar um produto que contém um certificado de reconhecimento ambiental reforça, de certo, a sua reputação, demonstrando ser não só ambiental, como socialmente responsável.

A componente ambiental é, em termos concursais, e por regimes europeus impostos aos Estados-membro, cada vez mais valorizada. Vejam-se os casos de “green public procurement”, que na escolha de um proponente obrigam a que se tenha em conta uma componente ecológica. Decididamente que, na adjudicação de um contrato inserido neste tipo de concursos, os agentes económicos que apresentam já um certificado de ambiente rigoroso se encontram em situação de vantagem perante os demais.

Em síntese, e nas palavras do Professor Vasco Pereira da Silva, esta intervenção administrativa, que decorre da atribuição de uma “marca de garantia ambiental” visa combater a “desinformação” provocada pela “utilização de técnicas publicitárias”, uma vez que “a etiqueta pressupõe para os consumidores a garantia pública e fidedigna de acreditação da composição e dos critérios de produção de um bem em face de uma publicidade eventualmente enganosa que utiliza distintivos ecológicos não normalizados”.

Relevância internacional desta rotulagem(1)

Apesar de desde 1992 estar na Europa implementada a ideia de um rótulo ecológico verde, os primeiros anos não revelaram sucesso, pois até 1995 nenhuma licença que permitisse a sua utilização fora atribuída.

As primeiras licenças surgiram então em 1996 e, desde então, que o seu número tem vindo a aumentar exponencialmente, verificando-se um total de 1357 licenças em 2011, que permitem a apresentação do rótulo ecológico, hoje, em mais de 17000 produtos.

O grupo de materiais com mais representatividade em termos de rótulo ecológico é o referente a revestimento para pavimentos rígidos, com 33% do número total de produtos premiados com a utilização deste rótulo.

Já em termos de países, a Itália é aquele que mais licenças de rotulagem ecológica atribui, com 9067 produtos ostentando o rótulo, seguindo-se da França e do Reino Unido.

Portugal tem ainda parca representatividade em termos de produtos de gama ecológica reconhecidos por este sistema europeu, mas podem-se identificar a Dyrup, a Robbialac, ou a Hempel como exemplos de empresas às quais a DGAE atribuiu a licença para utilização do “eco label”.

Nas palavras de Mário Tavares da Silva, o rótulo ecológico “ao fazer assentar as suas bases num modelo totalmente dependente da informação, assume-se como um dos mais poderosos e eficazes instrumentos legais com que a União Europeia dá resposta à sociedade de risco em que todos vivemos”.

(1)Os dados referidos foram retirados do sítio da internet relativo a este rótulo: http://ec.europa.eu/environment/ecolabel/facts-and-figures.html


Bibliografia

  • SILVA, Vasco Pereira da - Verde Cor de Direito: Lições de Direito do Ambiente, 2ª Reimpressão da Edição de 2002, Livraria Almedina;
  • SILVA, Vasco Pereira da - Em Busca do Acto Administrativo Perdido, Livraria Almedina, 1996
  • GOMES, Carla Amado - Introdução ao Direito do Ambiente, Lisboa: AAFDL, 2012;
  • MATEO, Ramón Martín - Manual de Derecho Ambiental, 3ª Edição, Navarra: Thomson, 2003;
  • SILVA, Mário Rui Ferreira Tavares da - O Rótulo Ecológico Comunitário (REC) e o Eco-management and audit scheme (EMAS): Ensaio sobre a sua qualificação jus-administrativa, Lisboa: Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 2009.

Leila Sofia da Ponte Monteiro,
Aluna nº 20861


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