13 de abril de 2014

Breve comentário ao Acórdão nº 136/2005

       
       Na sequência de uma organização ambientalista ter visto ser indeferido pelo Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, um requerimento de intimação do Primeiro-Ministro, com o intuito de ver facultada certidões relativas a um contrato celebrado entre o Estado Português e empresas do grupo B, com o objectivo de avaliar a incidência ambiental e concorrencial do projecto de implantação de uma unidade industrial em Esposende, a organização decidiu interpor recurso para o Tribunal Central Administrativo, no qual alegava a inconstitucionalidade dos artigos 10 da Lei 65/93, de 26 de Agosto (L.A.D.A - Lei de acesso a documentos da administração) e 13, nº 1 do DL 321/95, de 28 de Novembro, isto por entender que impunham reservas do direito à informação para além do consagrado no artigo 286, nº 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP). O tribunal negou provimento ao recurso por entender que, estando em causa uma colisão entre o direito à informação e os direitos à propriedade e iniciativa privada, com o inerente segredo industrial e comercial, teria de considerar-se o artigo 10 da L.A.D.A. sendo que, só quando não exista lei é legítima a ponderação dos valores em conflito pelo intérprete.
       Desta maneira, a organização ambientalista recorreu para o Tribunal Constitucional, de modo a serem apreciadas as normas constantes dos artigos supra referidos.
O Tribunal Constitucional julgou os  referidos artigos não inconstitucionais, seguindo então decisões anteriores, nomeadamente o acórdão 254/99, na medida em que as restrições ao direito à informação, ainda que não resultassem directamente da letra do artigo 268, nº 2 da CRP, resultavam de preceitos cujos valores subjacentes, tal como o segredo comercial e industrial, gozariam de protecção igualmente. O Tribunal Constitucional entendeu assim que, toda e qualquer informação relacionada com o projecto estava sujeita ao dever de sigilo, sem fazer qualquer ponderação, contrariamente ao que já teria feito anteriormente, designadamente nos acórdãos 335/99 e 385/99.
Ora, é neste ponto que discordamos da decisão em causa. É entendimento unânime que todos os direitos fundamentais podem ser restringidos por outro direitos ou bens constitucionalmente protegidos, com os quais estejam em situação de conflito. Isto porque,  não é possível fazer-se uma previsão exaustiva de todas as realidades que possam, eventualmente, entrar em conflito. 
Visto que o ambiente consubstancia-se num interesse constitucionalmente protegido, era necessário, no caso sub judice, fazer-se uma ponderação casuística das realidades em questão. Não estando em causa um direito absoluto, podem existir restrições para além das constantes do artigo 268, nº 2 da CRP, ainda assim essas restrições não podem ser arbitrárias. O caso em análise necessitava de uma ponderação dos valores em causa, o que não foi feito pelo Tribunal Constitucional, violando-se assim, os princípios da proporcionalidade, adequação e necessidade, previsto no artigo 18, nº 2 da CRP.
     Mais dois pontos que consideramos relevantes e que não foram atendidos pelo tribunal. Em primeiro lugar, para garantir uma correcta defesa e preservação do ambiente, bem como uma maior legitimidade respeitante à actuação administativa, é fulcral garantir o acesso è informação ambiental e, em segundo lugar, o facto de o princípio da prevenção ambiental reclamar uma actuação ex ante, o que torna o acesso a informação essencial.
   Parece-nos também que o Tribunal Constitucional deveria ter atendido à Convenção Aarhus, a qual, entre outras matérias, propõe uma garantia de acesso ao público à informação sobre ambiente. Isto porque, Portugal tornou-se parte em 2003 e, devia ter sido considerada a especialidade do direito à informação ambiental.
Em jeito de conclusão, importa referir que, nos dias de hoje, pensamos que esta decisão teria sido diferente, visto que, a Lei 19/2006 de 12 de Junho (L.A.I.A - Lei de acesso à informação sobre ambiente) veio introduzir alterações significativas. No caso analisado, teríamos de atender ao artigo 11, nº 6, alínea d), sendo que o pedido de acesso à informação poderia ser negado se prejudicasse a confidencialidade de informações comerciais ou industriais. Mas, ainda assim, teríamos de atender também aos números 7 e 8 do artigo 11, sendo que, o referido nº 6 não justifica toda e qualquer restrição, havendo a necessidade de uma interpretação restritiva dos fundamentos do indeferimento, com base num juízo de proporcionalidade.


Joana Gonçalves

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