"Quando a culpa é de todos, não é de ninguém"
O ambiente não pode ser objecto
de direitos privados, é insusceptível de apropriação individual. De acordo com
o art.202./2 Código Civil, é um “bem fora do comércio”. Segundo, segundo Menezes
Leitão, esta ideia partia do pressuposto de que o ambiente era uma realidade
ilimitada e renovável.
Sabemos
que hoje não é assim. Cada vez mais, vimos a assistir à consciencialização de
que o ambiente é um bem limitado, finito, e o suporte à vida, como a conhecemos.
Desta forma, temos assistido a uma mudança de paradigma – de uma visão
utilitarista e de domínio do Homem sobre a Terra, passamos agora para uma consciência
de que os recursos são finitos, que temos um dever se preservar o planeta para
as gerações vindouras. Tal como os pais que amealham dinheiro para proporcionar
aos filhos um futuro melhor, mais desafogado, esta deveria ser também a relação
com o meio ambiente, de forma a deixarmos o melhor planeta aos nossos
descendentes – é indubitável que vivemos ainda num mundo capitalista, em que é
dada uma importância desmedida ao bem dinheiro - mas é este o caminho que
estamos a percorrer, passo a passo.
É neste
contexto que aparece o instituto da responsabilidade civil, para matérias
ambientais – a responsabilidade civil ambiental. Contudo, a adaptação deste
regime coloca inúmeros problemas, por um lado, quanto à determinação dos
pressupostos, por outro, relativamente à eficácia da indemnização, neste
âmbito.
Em
primeiro lugar, pode colocar-se um problema de nexo de causalidade entre o facto,
que ocorre num determinado espaço, e o dano, que pode manifestar-se numa área geográfica
distinta, e revelar-se de diferentes formas. Por outro lado, este dano não tem,
em concreto, um único responsável, nem sequer uma pluralidade determinada ou
determinável, de responsáveis. O que acontece, é que existem inúmeros agentes
poluidores, e é da sua actividade cumulada que resulta o dano. Ainda que este
não seja o caso, apurar quem foi o responsável por tal dano é quase impossível,
a acrescentar ainda a interferência que as alterações climatéricas podem
representar neste contexto, e a concorrência com essa actividade poluente. Uma
solução poderia passar pela “presunção de causalidade”, quando as empresas
estiverem e acordo com as circunstâncias do caso concreto, em condições de
verificar os danos provocados.[1]
Parece-me que esta solução é perigosa e ineficaz em muitas situações – as
empresas de certo sector podem encontrar bastantes dificuldades em ilidir tal
presunção, é um ónus muito penoso.
Também
se colocam problemas à determinação dos titulares do direito de indemnização,
que tal como acontece com os poluidores, pode ser quase impossível sua
identificação. O Professor Menezes Leitão oferece o exemplo de uma maré negra –
os titulares da indemnização serão os pescadores da zona? Ou os hotéis, que
perderam clientes? Ou serão ainda os turistas, que vêm as suas expectativas de
viagem frustradas? Em última análise, o reconhecimento das pessoas lesadas pode
ser tão abrangente, que será insustentável esta ideia de indemnização por danos
sofridos.
Relativamente
à indemnização, o direito civil entende-a apenas como ressarcimento dos danos,
não impendido sequer a continuação da actividade danosa. Acontece que não são
estas as necessidades do Direito do Ambiente, que passam pela lógica contrária,
de cessação da actividade danosa, e de prevenção.[2]
Outro problema suscitado pela maioria dos autores, prende-se com as repercussões
desta indemnização nos preços dos produtos. Parece-me que o problema é mais
aparente, sendo que o que se pretende com a responsabilidade civil pelos danos
ambientais, é exactamente o ressarcimento desses mesmos danos, antes de
qualquer culpa da empresa, pressuposto que, na responsabilidade ambiental, como
adianta Luís de Menezes Leitão, pode mesmo ser dispensado. Por isso, este não é um exacto problema da
aplicação da responsabilidade civil ao direito ambiental. O principal objectivo
não passa por penalizar a empresa ou os consumidores, mas em indemnizar os
danos causados – outro problema nada fácil de determinar. No caso apresentado
da maré negra, o dano era a poluição da àgua, mas havia muitos titulares
prejudicados, havia muitos “danos” decorrentes do dano principal.
Distinguem-se
danos ambientais de danos ecológicos, entendendo-se que os primeiros são
aqueles que violam bens jurídicos concretos, com poluidores tendencialmente
determinados ou, pelo menos, determináveis. Por seu lado, os danos ecológicos
são mais abstractos, em que há um dano do sistema ecológico, mas sem haver violação
de direitos individuais.
A lógica
da responsabilidade civil adequa-se muito mais aos primeiros, aos danos ambientais.
No fundo, são situações mais específicas, em que se conseguem preencher os
pressupostos da responsabilidade civil – facto, ilicitude, dano e nexo de
causalidade (no sentido de prescindir da culpa, ainda que esta possa ter lugar
na maioria dos casos).
Desta
forma, aparece o Decreto-Lei 147/2008, a consagrar o regime da responsabilidade
civil ambiental, distinguindo nos seus capítulos, dano ecológico e ambiental.
Parece-me
que um dos principais problemas em toda esta lógica de responsabilidade civil
por dano ambiental se prende com a impossibilidade de reparação do dano. Como
se ultrapassa o problema de determinar a reparação do dano de extinção de uma
determinada espécie? Através de uma indemnização? A quem?
Temos
ainda um longo caminho a percorrer em matéria de consciencialização ambiental,
e de medidas concretas para dar respostas a todos estes problemas. Parece-me
que a responsabilidade civil ambiental consiste numa aplicação de certa forma
imperfeita – porque os danos ambientais e a sua reparação têm de ser pensados
noutra perspectiva – de solidariedade, cooperação, percepção das implicações
das nossas actuações para o bem comum.
Inês Tamissa de Barros, aluna 20813
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